Aracê e Numix: duas apostas de Brasília para a nova contabilidade — com IA, transparência e coragem

Na sala envidraçada de um coworking na Asa Norte, uma tela exibe o que parece um painel de controle de usina: tarefas, pendências, notas fiscais que não “batem”, um sinal âmbar em “crédito a conferir”. “É para iluminar o que, por décadas, ficou escuro”, diz Danrley Pereira, engenheiro de software que passou a última década entregando projetos para equipes nos Estados Unidos e Europa. “Quero trazer o que aprendi — IA, RAG, MCP — para resolver um problema real no meu país: contabilidade que explique, não esconda.”

A cena resume a ambição da Aracê — nome tupi-guarani associado a sol/amanhecer — e ajuda a entender por que Brasília, mais conhecida pelo peso do Estado, começa a emplacar empresas que conversam com o futuro da reforma tributária: IVA dual (CBS + IBS), split payment e obrigações mais digitais — um “novo normal” que pede menos adivinhação e mais engenharia. (Serviços e Informações do Brasil)

Do outro lado da cidade, num apartamento transformado em escritório, um empreendedor sul-coreano organiza suas anotações num português ainda hesitante. John Park desembarcou no Brasil há pouco mais de um ano e meio. “Pensei: dá para usar IA para atacar a dor tributária?”, lembra. “A tecnologia avançou a ponto de lidar com linguagem natural. Então, por que não trazer automação de verdade para tarefas que sempre foram manuais nas firmas?”

Se a Aracê quer clarear processos com explicabilidade e colaboração, a Numix, de Park, mira baixar o custo operacional por meio de automação — e, com isso, tornar serviços contábeis mais acessíveis, especialmente num momento em que a tributação no destino, o crédito amplo e o split redesenham rotinas de escritórios e ERPs. “O impacto é produtividade e acesso: o custo cai, e a contabilidade alcança mais empresas”, insiste John. (Reuters)

A curva que vem aí

A reforma já foi promulgada; o país entrou na fase de regulamentação. O Ministério da Fazenda centraliza PLPs, vídeos e FAQs; o Senado descreve, em linguagem direta, a linha do tempo: piloto em 2026, convivência de dois sistemas até 2032 e consolidação em 2033. Isso tem efeitos muito concretos nos produtos — e ambos os times sabem. “Software bonito não basta”, diz Danrley. “Precisamos de motor fiscal versionado, logs que prestam contas, e IA que explique por que alertou.” (Serviços e Informações do Brasil)

O split payment, frequentemente apelidado de “PIX dos impostos”, não cria tributo novo; apenas automatiza o repasse de CBS/IBS — o governo fala em implantação por etapas, para não travar o comércio. Mas ele encurta o caminho do dinheiro e muda o ritmo do caixa. “É onde software ruim vai doer”, provoca Danrley. “Quem não mede, não explica; quem não explica, não corrige.” (Serviços e Informações do Brasil)

Brasília, contra a maré

Fazer startup na capital não é conto de fadas. “Faltou ecossistema e sobrou solidão”, diz John, sobre a tentativa de captação e o dia a dia fora do eixo. “Barreira de idioma, capital caro, e pouca cultura de comunidade.” A ida ao Vale do Silício serviu de contraste: “Funciona diferente: há capital paciente e gente que entende a dor.”

Mesmo assim, o mapa se mexe. Programas como Start BSB/FAP-DF e o Biotic funcionam como pontes entre academia, empresas e governo; o país recebeu grandes sinais de capitalWarburg Pincus investindo US$ 125 milhões na Contabilizei; a Visma comprando a ContaAzul por quase R$ 2 bilhões — lembretes de que plataforma robusta e escala importam. “Quando o dinheiro inteligente entra, ele não compra interface — compra processo”, diz Anna, marketeira da Aracê. “E processo, aqui, é a diferença entre cumprir a lei e tropeçar.” (fap.df.gov.br)

O que Aracê quer provar

No quadro branco, a Aracê desenha um triângulo simples: gestor, contador, sistema — todos olhando o mesmo painel, com alertas explicáveis e playbooks passo a passo. Lucas Zanetti, Pedro Druck, Guilherme Amaral e Gabriel Fariacientistas da computação e engenheiros de software — tratam regra fiscal como código: versionada, testável, auditável. “A tecnologia vira linha de base”, resume Danrley. “A vantagem é governar dados e explicar decisões.”

A ambição, aqui, é menos “mais botão” e mais responsabilização: cada alerta carrega um porquê (regra, documento, rota de correção). Com o IVA dual e o período de dois regimes no horizonte, o produto nasce para a travessia — CBS/IBS no núcleo, simulações de margem e sensibilidade a split no contas a receber. “Não quero que o contador vire operador de planilha. Quero que ele volte a ser estrategista,” diz Danrley. “Se a IA não explica, ela vira ruído. A nossa explica.” (Senado Federal)

O que Numix quer escalar

John não está desenhando “o contador do futuro”, mas a oficina automática por trás dele. A Numix nasce para turbinar firmas com automação guiada por IA — classificação de documentos, conferências de rotina, reconciliações — nas partes onde a linguagem natural antes bloqueava o avanço. “Antes, regra escrita não alcançava texto aberto”, ele diz. “Agora alcança.” Resultado? custo menor por CNPJ atendido, mais acesso a serviço profissional, menos retrabalho. “A produtividade não é um slide. É uma fatura que cabe no bolso de mais gente.”

E por que isso importa agora

Há uma janela rara em que a lei pede tecnologia — e não o contrário. A reforma força o setor a abandonar remendos: dados auditáveis, logs que contam história, integrações oficiais e IA com explicabilidade deixam de ser luxo e viram requisitos mínimos. A diferença é que, em Brasília, algumas equipes estão mapeando a dor até o detalhe — e criando produtos que nascem no IVA, em vez de tentarem “adicionar IVA por cima”.

“Se der certo,” arrisca Danrley, “o contador vai gastar menos tempo apagando incêndio e mais tempo dizendo ‘este é o melhor caminho’.” John concorda, de outro ângulo: “Se a automação derruba custo, a contabilidade deixa de ser um privilégio e vira infraestrutura para pequenas empresas.”

Para acompanhar a travessia: a base constitucional está na EC 132/2023, o hub da Fazenda reúne regulamentação, vídeos e FAQs, e checagens independentes explicam por que o split não cria impostoautomatiza o repasse de CBS/IBS. Na prática, é isso que Aracê e Numix estão programando. E é daí que pode nascer uma contabilidade mais clara, mais justa — e finalmente compreensível. (Planalto)

Notas de reportagem: Declarações de John Park foram extraídas de entrevistas gravadas e transcritas pelo repórter.

Da Redação do Gama Cidadão – Israel Carvalho e Danrley Pereira com redação de Lucas Lieggio.

 

Danrley Pereira

Social Media, Jornalista DRT nº 0012449/DF e Engenheiro de Software em https://dwcorp.com.br.

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